Como qualquer escola estadual
brasileira, o Costa e Silva, carinhosamente apelidado de " Costinha" pelos
membros da institui��o, vive um momento de abandono e descaso por parte do governo.
Atendendo uma popula��o de baixa renda na maioria, seus alunos s�o pessoas que j�
trazem de casa v�rias mazelas e dificuldades de relacionamento, sendo que seus pr�prios
pais tem um tempestuoso curr�culo educativo, muitas vezes tendo abandonado a escola em
vista de um fracasso pessoal em conseguir estudar. Al�m do mais, essas crian�as sofrem
de todos os problemas que reconhecemos na realidade brasileira: a desnutri��o, falta de
material escolar, de brinquedos pedag�gicos em casa, etc. A pr�pria escola carece de
muito material nesse sentido, o que prejudica para realizar um bom ensino. Inclusive,
salientando esse ponto, houve dificuldades de implementar meu projeto porque ele visava a
utiliza��o da inform�tica na sala de aula, mas no entanto n�o foi poss�vel termos um
acesso a internet na escola, porque isso encareceria muito e representaria um �nus muito
grande para a mesma, visto que o projeto governamental de colocar a internet na sala de
aula n�o privilegia uma baixa manuten��o da mesma, pois todas as despesas decorrentes
da utiliza��o das linhas telef�nicas e do provedor de acesso s�o de responsabilidade
do CPM( Centro de Pais e Mestres) que, devido a dificuldade que uma popula��o carente
como esta enfrenta, logicamente n�o pode arcar com todos os custos.
OS PRINCIPAIS
PROBLEMAS LEVANTADOS DENTRO DA ESCOLA
Muitos professores se queixam de
que os alunos s�o indisciplinados e que alguns representam um verdadeiro fracasso da
institui��o escola. As principais queixas se relacionavam com uma impot�ncia da escola
em conseguir construir dispositivos para ajudar aos alunos que n�o conseguem seguir o
conte�do do ano letivo, em poder resgatar de alguma forma esses que se tornam, aos
poucos, o fracasso da escola.
� comum ouvir das professoras
que, determinado aluno que tem problemas de comportamento e de aprendizagem na
pr�-escola, ir� apresentar os mesmos problemas durante todo seu curr�culo escolar. Por
isso eles apresentam uma vasta ficha escolar detalhando todo o seu comportamento, que
acaba se repetindo ano ap�s ano, figurando um fracasso da escola em conseguir solucionar
este problema.
"Existe entre os educadores uma preocupa��o permanente quanto aos problemas acerca
da reprova��o, da evas�o e da repet�ncia escolar na 1a. s�rie do I grau.
Estat�sticas mostram que a passagem da primeira para a segunda s�rie ainda apresenta em
nosso pa�s a maior taxa de reprova��o escolar". Ferreiro (1988, p. 9).
Depois este mesmo autor
destaca que "tradicionalmente a alfabetiza��o inicial � considerada em
fun��o da rela��o entre o m�todo utilizado e o estado de maturidade ou de prontid�o
da crian�a Os dois p�los de processo de aprendizagem (quem ensina e quem aprende) t�m
sido caracterizados sem que se leve em conta o terceiro elemento da rela��o: a natureza
do objeto de conhecimento envolvendo esta aprendizagem".
Santarosa demonstra como este
�ltimo interv�m no processo, n�o como uma entidade �nica mas como "...uma
tr�ade envolvendo a representa��o alfab�tica espec�fica da linguagem com suas
caracter�sticas espec�ficas da linguagem e as concep��es que os que aprendem e ensinam
t�m sobre este objeto" (Santarosa, Lucila Maria Costi- O processo de
Alfabetiza��o de Crian�as com dificuldades de Aprendizagem em Ambientes L�dicos
Computacionais)
Essa queixa central � importante
n�o apenas por representar um problema insol�vel, mas porque p�e a pique a pr�pria
validade do m�todo de ensino. Em geral a comunidade confere a escola o poder de
introduzir as crian�as no ambiente social e ensinar-lhes os princ�pios e normas que
regem a nossa conduta coletiva. O aumento da viol�ncia, da delinq��ncia, da falta de
motiva��o dos jovens em buscar nos estudos um caminho para melhorar de vida, tudo isso
soa angustiante para a sociedade pois representa um erro ali posto que n�o conseguimos
encontrar: sabemos que falhamos em algum lugar, s� n�o sabemos aonde. Seria mais correto
dizer que os alunos apresentam o seguinte quadro:
'"Tal atraso se deve em
decorr�ncia de problemas na constru��o de algum elemento constituinte de suas
estruturas mentais. Ou seja, sendo o conhecimento fruto da intera��o do sujeito com o
meio, em algum momento da vida dessas crian�as, no per�odo cr�tico dos zero aos sete
anos, a qualidade dessa intera��o esteve comprometida. Isto gerou uma lacuna nas suas
constru��es cognitivas, acarretando um d�ficit intelectual."( Franco, Sergio
Roberto Kieling, O construtivismo e a educa��o- p�g. 52)
Abro um par�nteses aqui para
discutir como essa quest�o tornou-se de car�ter universal, ultrapassando o �mbito de
algo setorizado. Sempre buscamos construir uma sociedade melhor e mais justa, passando
nossos valores e o que realizamos para as gera��es futuras. Nestes que est�o por vir,
acreditamos que levar�o adiante a obra que, inexoravelmente, sempre deixamos inacabada.
Na hist�ria de nossa exist�ncia, transmitimos a eles nossas id�ias, nossas falhas e com
isso queremos deixar marcos para que eles possam se guiar no futuro. Vislumbramos assim
que nossa exist�ncia n�o ter� sido em v�o, pois sobreviveremos na lembran�a da
gera��o futura e nosso aprendizado guiar�-los como uma b�ssola.
No entanto, na contemporaniedade
as coisas n�o se desenvolvem como imaginamos. Parece que a nova gera��o n�o respeita
nenhum valor ou ideal, que a nossa hist�ria � totalmente desconsiderada. Surge uma
gera��o sem nenhuma perspectiva, incerta quanto ao futuro e descrente dos ensinamentos
do passado. E pior, a viol�ncia, as drogas o sexo, surgem em uma urg�ncia e em uma
despropor��o avassaladora, uma busca desesperada por prazer. O fato da vida humana ter
sido banalizada e dos jovens se matarem entre si parece estar relacionada ao fato de que
n�o existe mais ideais pelos quais lutar, n�o h� mais id�ias importantes no contexto
social que signifiquem que a vida implica uma participa��o ativa e importante para a
comunidade.
Aos jovens de classe baixa,
tem-se a id�ia de que n�o h� meio de ascenderem socialmente, a escola deixa de ser uma
oportunidade de mudarem de vida para tornar-se um empecilho. Estar�amos errados em supor
estes fen�menos apenas como das classes menos favorecidas, pois nas classes mais
abastadas verifica-se tamb�m essa posi��o c�nica em rela��o aos ideais sociais. N�o
se confia mais na lei, acredita-se que qualquer forma de enriquecimento � v�lida e,
principalmente, vive-se em busca de um prazer sem limites em um para�so onde pode-se ter
tudo que se queira. Trocou-se a hist�ria e os ideais pelo prazer ilimitado como fio
condutor de nosso comportamento.
� nesse contexto que uma
an�lise da posi��o da escola hoje � muito importante, pois ela � a institui��o
respons�vel pela veicula��o dos id�ias sociais, ela � que faz a transi��o do
sujeito do contexto familiar para o social. Se existe uma fal�ncia de valores, a escola
tem sua parcela de responsabilidade nisso e tamb�m os dispositivos necess�rios, talvez
mais do que outras institui��es sociais, para poder reverter esse quadro. A escola
sempre foi o basti�o do saber, o lugar onde o jovem prepara-se para sua vida
profissional. Todas as disciplinas ministradas tem como objetivo inseri-lo no contexto do
saber humano e lhe dar uma vis�o de como agir socialmente. Se a nova gera��o vive um
descr�dito em rela��o aos fundamentos primordiais de uma sociedade, o conhecimento
ministrado nas salas de aula tamb�m n�o est� sendo valorizado e o aluno est� mantendo
uma forma err�nea de relacionar-se com o saber, pois n�o vislumbra mais neste uma
possibilidade de ascens�o social ou de aplicabilidade em seu cotidiano. E sabemos que a
socializa��o n�o nasce espontaneamente, � preciso cultiv�-la pela metodologia de
aula:
"� a aus�ncia das
formas verbais, que marcam a liga��o l�gica, que impede a discuss�o verdadeira de
aparecer, ou � a aus�ncia de necessidade de discutir e de colaborar que explica a
apari��o tardia das formas verbais em quest�o? Se admitirmos que o pensamento da
crian�a depende dos interesses e da atividade infantil, mais do que o inverso, �
evidente que a aus�ncia da necessidade de discutir e de colaborar ser� o fator
primitivo..."(Piaget, Jean- A linguagem e o pensamento da crian�a, p�g.86)
E este fen�meno, no meu
entender, est� diretamente ligado a forma como o conhecimento humano � ministrado nas
escolas. Em primeiro lugar, como a pr�pria escola encara o conhecimento, como o professor
v� o papel que ele exerce n�o s� sua atividade em si mesma, o ato de ensinar, mas o
significado social de seu trabalho.
"O direito �
educa��o(...) n�o � apenas o direito de freq�entar escolas: � tamb�m, na medida em
que vise a educa��o ao pleno desenvolvimento da personalidade, o direito de encontrar
nessas escolas tudo aquilo que seja necess�rio � constru��o de um racioc�nio pronto e
de uma consci�ncia moral desperta."( Piaget, Jean- Para onde vai a educa��o?,
p�g. 53)
Sabemos que os professores se
queixam de que socialmente seu trabalho n�o tem o reconhecimento merecido. Mas acho
importante salientar que os professores tamb�m n�o possuem uma vis�o muito clara de seu
papel. Afinal, ser professor prim�rio n�o � meramente repetir conte�dos em sala de
aula ou simplesmente cuidar de crian�as. Os pr�prios professores desconhecem sua
influ�ncia no car�ter e forma��o da personalidade dos jovens. Falta ainda para a
categoria dos professores prim�rios poder refletir sobre seu lugar social e as nuances
que engloba seu trabalho, para depois poder mostrar a sociedade como a educa��o em si �
importante e cobrar o reconhecimento esperado.
" Unicamente na medida
em que os m�todos de ensino sejam ativos- isto �, confiram uma participa��o cada vez
maior �s iniciativas e aos esfor�os espont�neos do aluno- os resultados obtidos ser�o
significativos."( Piaget, Jean. Para onde vai a educa��o? p�g.47)
Outro ponto importante � que a
escola traz de seu passado um vis�o diferente de educa��o, a chamada escola
tradicional. Embora hoje em dia esteja sendo modificada esta vis�o e se utilize mais uma
abordagem cognitivista, ainda assim permanece resqu�cios do passado. N�o se modifica de
uma hora para outra todo um sistema que vingou por anos a fio: o que ocorre � mais uma
passagem, onde por vezes coexistem elementos da escola tradicional com o construtivismo,
mesmo sendo estes elementos antag�nicos entre si. A escola tamb�m n�o se encontra
totalmente pronta para poder transmitir uma educa��o totalmente construtivista
englobando as tecnologias e anseios pr�prios da nossa comtenporaniedade. Isso desestimula
ainda mais o jovem, pois sente n�o encontrar nesta uma refer�ncia para ajud�-lo a
enfrentar os problemas do cotidiano.
PRIMEIRAS
INTERVEN��ES NO UNIVERSO FAMILIAR
As entrevistas realizadas n�o
foram de car�ter cl�nico, ou seja, n�o procurei aprofundar-me nos problemas
psicol�gicos individuais e familiares nem tratar especificamente quest�es pessoais. As
entrevistas simplesmente foram para saber acerca de como � o cotidiano dos alunos e o que
os pais poderiam ensinar para a escola.
O ponto mais importante era ver
como a escola contribui para a forma��o emocional da crian�a e qual seu papel na esfera
familiar. � salutar que a educa��o engloba tamb�m assegurar ao indiv�duo uma boa
forma��o emocional e uma realiza��o sentimental, pois a escola participa e determina
na forma como o indiv�duo estrutura suas rela��es sociais. Analisando componentes
emocionais, procurei ver como a metodologia poderia ser constru�da abarcando elementos
necess�rios para uma boa estrutura��o emocional, pois est� � para mim indissoci�vel
do processo de aprendizagem, sem ela n�o acredito que possa haver uma aprendizagem
eficaz.
Assim os trechos aqui relatados
n�o s�o estudos de caso nem an�lises cl�nicas, n�o procedi a nenhuma constru��o de
diagn�stico e, determinados elementos ou conceitualiza��es de patologias foram feitas
apenas como mera observa��es, podendo estarem equivocadas. Sabemos que sem uma an�lise
aprofundada e de car�ter terap�utico n�o podemos tra�ar um perfil diagn�stico
verdadeiro. Mas, como disse acima, esse n�o foi meu objetivo, pois apenas colhia dados
para realizar um trabalho de psicologia escolar, n�o cl�nica.
Os sujeitos aqui n�o foram
abordados em um setting psicol�gico ou atrav�s de uma t�cnica psicol�gica de
entrevista, mas apenas em conversas informais. N�o colhi nennum dado mais significativo
sobre a personalidade ou sintomas das crian�as, apenas como a fam�lia via os problemas
destas e o que aconselhava, emsua sabedoria familiar, a sanar o problema.
Claro que muitos dos problemas
das crian�as envolvem quest�es emocionais complexas e profundas, que somente seriam
sanadas com um trabalho de terapia. Enfim, abri m�o de colher dados mais significativos e
mais veross�veis porque me detive mais em um trabalho de psicologia escolar,
concentrando-me no aprimoramento da metodologia escolar. Tenha certeza que se tivesse sido
feito um trabalho de entrevistas cl�nicas, poderia ser bem mais �til para como se
construiria uma metoologia para aqueles alunos em especial, mas infelizmente isso ficar�
como projeto futuro, talvez como id�ia para os pr�ximos estagi�rios que me
susbtituir�o.
Claro que muitos dos problemas
das crian�as envolvem quest�es emocionais complexas e profundas, que somente seriam
sanadas com um trabalho de terapia. Enfim, abri m�o de colher dados mais significativos e
mais veross�veis porque me detive mais em um trabalho de psicologia escolar,
concentrando-me no aprimoramento da metodologia escolar. Tenha certeza que se tivesse sido
feito um trabalho de entrevistas cl�nicas, poderia ser bem mais �til para como se
construiria uma metoologia para aqueles alunos em especial, mas infelizmente isso ficar�
como projeto futuro, talvez como id�ia para os pr�ximos estagi�rios que me
susbtituir�o.
Resolvi iniciar minha abordagem
conversando com a fam�lia dos alunos e estabelecendo com esta um primeiro contato. Nesta
sala acima descrita, tomei a resolu��o de atender cinco fam�lias por vez, a cada turno
de trabalho, dando um total de 15 fam�lias por semana. Caso fosse necess�rio, reservei
hor�rios vagos para uma segunda entrevista e para problemas adicionais que pudessem
surgir. Das in�meras fam�lias que atendi, citarei aqui alguns exemplos.
O primeiro caso que procurei
averiguar era de J., de 13 anos, 2� ano do 1� grau, que havia repetido de ano v�rias
vezes, al�m de um extenso n�mero de queixas sobre seu comportamento. Convido sua
fam�lia para comparecer, atrav�s de um bilhete, para que possamos conversar acerca dos
problemas de J. Ap�s v�rias tentativas frustradas, pois sua m�e nunca comparecia,
finalmente ele veio em um dos hor�rios combinados.
Primeira entrevista. A m�e vem
acompanhada de sua filha pequena, um beb� de colo. Lhe pergunto:
- A senhora sabia que J. vem
apresentando problemas na escola h� muito tempo?
- Eu sei que ele repetiu v�rias
vezes- diz ela- mas eu n�o posso tomar conta dele, minha filha tem grave problema de
asma, eu tenho de viver com ela no hospital. Se d� uma crise, l� estou eu com ela, tenho
que correr pro hospital!
- E a senhora j� procurou um
tratamento para ela, como est� a sa�de dela?
- Eu vou agora num especialista,
acho que a� ajuda mais, vai me sobrar tempo para J. ent�o...
- A senhora acompanha o
desempenho dele na escola?
- Eu n�o posso, vivo cuidando da
minha filha, agora no inverno ela piorou n�o pude saber como ele t�...
- A senhora � separada?
- Sou, meu marido foi embora a
tempos.... eu que cuido dos dois...
- A professora falou tamb�m que
J. muitas vezes n�o traz material escolar, nem mesmo um l�pis- indago.
- Pois �, eu �s vezes n�o
posso comprar material... sabe, eu trabalho como faxineira, a gente n�o tem muito
dinheiro... quero ver se, com minha filha melhorando, pego um emprego que pague mais.
A entrevista ainda se estende por
uma hora e meia, onde indago mais sobre o ambiente familiar, as rela��es de J., sua
inf�ncia, etc. Conversamos depois, eu e a m�e de J., com sua professora, pois esta
poderia dar mais detalhes das dificuldades deste e melhor conselhos sobre o que poderia
ser feito na parte de aprendizagem. Como diz Piaget:
" ... se toda pessoa tem
direito � educa��o, � evidente que os pais tamb�m possuem, e igualmente por
prioridade, o direito de serem sen�o educados, ao menos informados e mesmo formados no
tocante � melhor educa��o a ser proporcionada a seus filhos." (Jean Piaget,
Para onde vai a educa��o?, p�g. 50)
Existe na escola um per�odo
livre no dia de entrega de boletins que � reservado para que os pais questionem os
professores acerca de como anda o aprendizado de seus filhos e possam obter maior
esclarecimentos dos professores. S� que no caso da m�e de J., como ela estava no
hospital com sua filha na �ltima vez que ocorreu essa reuni�o, ela n�o pode falar com a
professora, pois esta � a �nica possibilidade estipulada.
Firmamos um acordo, primeiro, de
que em vista das dificuldades da m�e de J. ela poderia obter maiores dados sobre o
desempenho do filho, mesmo quando n�o fosse o dia da reuni�o e que poderia-se combinar
outro dia caso fosse necess�rio, de comum acordo entre a m�e e a professora. Al�m
disso, atrav�s de contatos com outras m�es e mesmo com o servi�o m�dico do CAE,
disponibilizamos um atendimento mais r�pido e um encaminhamento protamente para um
especialista para a irm� menor de J., al�m de que orientei com a m�e toda uma mudan�a
de atitude, para que ela n�o menospreza-se J. e apenas supervaloriza-se um dos filhos.
Fiz ela entender que deveria se preocupar com J. tamb�m, e que ambos necessitavam de uma
parcela de aten��o. com isso, J. melhorou seu desempenho escolar tendo em vista que
podemos constatar que muito de suas atitudes indisciplinadas estavam ligadas a um desejo
inconsciente de chamar a aten��o da m�e. Ao todo, esse trabalho durou tr�s entrevistas
com a m�e e v�rios encontros com J., inclusive dentro da sala de aula. Logicamente que
todos os problemas dele n�o est�o solucionados, ele tem dificuldades de acompanhar seus
outros colegas e problemas de racioc�nio ligados a uma falta de estudo em casa, mas
pode-se sentir que sua ansiedade inicial- que lhe prejudicava muito em aula, conforme
relato da professora e que n�o havia sido notada pela m�e de J.( mais uma prova de que
ela estava ocupada demais com a filha menor e relegara J. a segundo plano, causando assim
um aumento de ansiedade neste)- estava menos intensa e ele parecia mais disposto a
realizar as tarefas em sala de aula.
Essa primeira interven��o que
realizei mostra como esse trabalho n�o se encerra em pouco tempo e necessita de uma
continuidade para dar bons frutos. N�o basta apenas, como no caso de J., descobrir e
procurar solucionar as causas de sua ansiedade, mas tamb�m de procurar recursos para
incentiv�-lo e auxiliar a desenvolver seu racioc�nio. Para demonstrar isso, mais adiante
falaremos da interven��o que foi realizada tamb�m com os professores.
O segundo caso onde realizei um
interven��o tratava-se de uma garota, de 12 anos, 1� ano, que havia repetido tamb�m
v�rias vezes e, al�m disso, tinha problemas de socializa��o. Conversei primeiro com a
aluna, depois ficou combinado, com o consentimento desta, que eu falaria tamb�m com sua
fam�lia.A entrevista ainda dura mais um tempo, onde a m�e de F. me conta como esta era
quando crian�a, o relacionamento com o pai, etc. Em princ�pio F. n�o quis vir novamente
falar comigo, ficou envergonhada mas achei que conversando com a m�e poderia auxiliar
muito F.
O caso de F. demonstrava que ela
tinha problemas de socializa��o e de repet�ncia n�o por dificuldades de aprendizagem,
mas por uma certa simbiose com a m�e, al�m de repetir o padr�o de comportamento desta,
de um certo isolamento. Dava ind�cios de um comportamento f�bico por parte da m�e que
afetava a filha tamb�m. Ap�s conversar com o pessoal do SOE, descubro que a m�e de F.
vem seguidamente ficar com esta durante o recreio, porque a filha n�o gosta de ficar
sozinha. Acredito que, se a m�e puder realizar uma separa��o entre ela a filha, isso
ajudar� muito a melhorar a socializa��o de F., pois ela precisa de uma falta, algo que
se insteva entre ela e a m�e como aus�ncia para que F. possa buscar algo fora, na
sociedade. Como foi ressaltado acima, n�o est� em quest�o um trabalho cl�nico de F. ou
de sua m�e, pois n�o intervi clinicamente nem a entrevista aqui � de car�ter cl�nico.
N�o fiz um diagn�stico da situa��o, apenas colhi impress�es. Seu comportamento
f�bico n�o foi um parecer psicol�gico mas apenas mais um dado como observador. Sliento
isso porque n�o fiz um trabalho cl�nico e pode ser que F. n�o seja exatamente um
comportamento f�bico. Teria que ser feita uma avalia��o psicol�gica e um tratamento
terap�utico para se determinar isso mais corretamente. O meu objetivo n�o foi
fazer cl�nica na escola, mas antes mostrar como dados colhidos com a fam�lia podem
influenciar a constru��o de uma metodologia mais eficaz de ensino. Serviu para
demonstrar que o papel da escola � tamb�m poder fazer a passagem de uma rela��o
familiar para a rela��o social, poder demonstrar a crian�a que a sociedade pode
prov�-la de coisas que a fam�lia n�o conseguiria. Essa � a li��o que tiramos do caso
de F. para auxiliar na constru��o da metodologia que iremos empregar. Quanto � F. em
particular n�o abordei seus problemas porque trabalhei com psicologia escolar, n�o
cl�nica.
A import�ncia de se instaurar
uma passagem do ambiente familiar para a sociedade pode ser contatada no dizer de Jandyra
Mengarelli:
" Dentre outras coisas
que se pode destacar desta forma de organiza��o dos la�os sociais, pensemos esta
particular met�fora a respeito dos modos de inscri��o do objeto e, portanto, das
diferentes categorias de falta a� presentes. Quando damos algo a algu�m vai junto uma
mensagem que, falando de um desejo, indica o famoso esp�rito da coisa, � sabido que o
presente surge, na hist�ria, como um objeto enviado no lugar da presen�a de um
convidado. Logo, o presente est� em lugar de uma falta. � presente da aus�ncia e vem se
fazer presente ali onde o ente n�o est�. Esta falta � real e o objeto que vem em seu
lugar participa de um simb�lico cultural. Pelo menos espera-se que assim seja. N�o � de
costume presentear os amigos com uma pedra, a menos que seja diamante, que tenha valor,
significa��o." ( V�rios, Educa-se uma crian�a?- texto de Jandyra Mengarelli,
Quando o pai padece no para�so)
Retomando a via do que Melany
Copit postulou, n�o basta apenas olharmos para o aluno no �mbito gen�rico, mas tamb�m
em sua especificidade de sujeito, o que o comp�e enquanto sujeito, somente assim
poderemos entender o fracasso escolar n�o apenas como um sintoma da sociedade, mas uma
quest�o que se reverbera no �mbito da �tica individual de cada um. Se tom�ssemos F.
pela tradi��o metodol�gica escolar, dir�amos que teria de haver a constru��o de
t�cnicas de socializa��o para com esta, al�m de din�micas de grupo. A metodologia do
professor teria de ser alterada para induzi-la a se socializar. Ao inv�s disso, indo
direto para seus estatutos que a fundam enquanto sujeito, primamos por ajudar a romper o
la�o que une m�e e filha, pouco importa se a interven��o se dar� em um ou outro lado,
mas � sabido que, ao trabalharmos com os adultos que cuidam da crian�a, obtemos
resultados mais r�pidos com esta, pois a fam�lia � que se constitui como principal
refer�ncia para ela neste per�odo de vida.
N�o basta apenas a separa��o
no entanto, pois se h� algo que impede, no caso de F., que esta ocorra, � porque a
separa��o n�o implica uma vida nova, mas uma aus�ncia. N�o h� o que colocar ali,
naquele lugar da falta. Como a m�e de F. que perde o marido e n�o busca algo, uma
modifica��o, um paliativo, digamos assim, ou substituto para essa falta, tamb�m para F.
a falta � insuport�vel porque n�o h� nada l�, apenas espa�o vazio.
� neste momento que entra em
cena a escola, disponibilizando pela aprendizagem e pelo conhecimento uma via segura, para
F. construir sua vida, independente da m�e. Como diz Jandyra Mengarreli, � preciso
colocar algo que d� significa��o ali onde se faz a falta. Conforme a m�e de F.
conseguiu propiciar uma separa��o entre estas, F. reconhece na escola um espa�o para
que ela possa construir sua individualidade, poder ter coisas para si e quem sabe at�
pensar em sua vida amorosa. Aos poucos, a m�e pode deixar aflorar seu pr�prio desejo e
sendo assim, separ�-lo do de F. enquanto esta, atrav�s de incentivo por parte de seus
professores para quando F. conseguiu buscar uma maior socializa��o com seus colegas. F.
atualmente j� brinca e conversa com v�rios colegas de aula, coisa impens�vel a um
pequeno tempo atr�s. Aos poucos, sai de seu casulo e nota que a escola tem um grande
presente para oferecer ali no lugar da separa��o do desejo materno.
Os outros v�rios casos
acompanhados por mim ser�o abordados aqui em linhas gerais, n�o por serem menos
importantes, mas porque os dois casos acima relatados me parecem mais frut�feros para
analisar as rela��es fam�lia-escola e o que se pode realizar entre a comunica��o
desses dois p�los.
O caso de W., 13 anos, n�o faz
parte dos alunos problemas, mas vou abord�-lo porque surgiu de um pedido diretamente da
m�e, que me procurou porque, segundo ela, a filha sofre de problemas de obesidade.
Aparentemente nada mais, mas basta uma primeira entrevista com a m�e para eu me
certificar do contr�rio. Sua m�e diz:
- Sabe eu me separei do meu
marido, isso afetou muito W., foi a partir da� que ela come�ou a engordar... ela tenta
fazer regime mas n�o consegue...
A m�e relata que se separou do
marido mas ainda sente saudades dele, que n�o sabe se realmente queria se separar.
O que eu pude sentir deste caso � que a m�e ainda parece indecisa se fica ou n�o com o
marido e talvez isso gere ansiedade na filha. Esse caso eu encaminhei para tratamento na
cl�nica ligada ao CAE mas, como a filha ainda n�o quer ir, eu acompanho por mais tempo.
Temos por norma encaminhar os casos quando verificamos que o problema pode ser sanado
clinicamente, �bvio que nosso trabalho n�o termina, damos um suporte ao trabalho
cl�nico que � realizado no CAE e trocamos relatos e comunica��es, para trabalhar a
escola e o corpo docente sobre como proceder, o que esperar e maiores informa��es que
consideramos �teis para auxiliar a crian�a, sempre resguardando o sigilo e jamais
trazendo conte�do de uma sess�o ou outra coisa particular da crian�a.
Isso � um ponto importante, pois
quando um professor mais curioso vem nos indagar sobre como est� o tratamento de tal
aluno, ou o que a fam�lia disse, transformamos esse interesse dele em uma forma de,
juntos, articularmos algumas proced�ncias que podem ser tomadas no referido caso, como
por exemplo estimular o aluno a dar boas respostas, parabenizar o comportamento bom dele,
deixar-lhe falar sobre as dificuldades. Nunca desprezamos o interesse do professor ou o
consideramos mal�volo, mas o direcionamos para um coisa boa, assim como tamb�m, atrav�s
desse procedimento, ensinamos o professor a direcionar o interesse do aluno para algo
produtivo e de grande valor para sua vida. um aluno irriquieto que perturba pode estar
querendo um n�mero maior de atividades, desenvolver seu potencial em outras �reas. Como
no caso de V. um garoto de 14 anos.
Ele n�o consegue parar quieto em
sala de aula e perturba outros colegas. Sua m�e no entanto n�o consegue ver isso:
- Mas ele � t�o quietinho, em
casa ele n�o me incomoda nada, nada! diz ela contradizendo a opini�o dos professores
Aos poucos, contudo, conforme
converso com ela, ela se contradiz:
-Eu e meu marido trabalhamos
fora, ele sempre fica sozinho a tarde, com a irm�.
-Ent�o como a senhora sabe que
ele n�o incomoda? Se ele est� na escola pela manh� e sozinho � tarde, a senhora n�o
tem muito contato com ele, n�o �?
Ela confirma que sim:
-Mas ele nunca foi de incomodar,
me retruca.
Ao fim dessa entrevista, pudemos
constatar que V. � muito hiperativo apesar de inteligente, e que sente-se sem ter o que
fazer o dia inteiro. Sugiro a m�e que lhe possibilite mais atividades, um esporte, um
curso. V. ainda tem apresentado problemas em sala de aula no entanto, e conjuntamente com
o corpo docente estamos tentando tornar V. mais participativo nas aulas, para que ele
possa utilizar suas energias de forma produtiva e auxiliar os colegas. Sua m�e disse que
somente poderia lhe dar um curso no ano que vem, por problemas financeiros, mas ficamos de
conversar e tra�ar um caminho para bem direcionar as energias de V. Trabalho tamb�m a
ida de V. e a fam�lia, obviamente, para uma consulta na cl�nica do CAE, mas a m�e
continua relutante. � um caso ainda inacabado.
Poderia categorizar G., de 10
anos, R. de 11 e E. de 10, como casos parecidos, que trazem uma problem�tica semelhante.
Eles v�m de uma fam�lia desestruturada, cujos pais n�o tem interesse em sua educa��o,
fazendo com que eles n�o possam desenvolver plenamente suas capacidades de aprendizado.
N�o conseguem permanecer quietos na sala e tem dificuldade de obedecer � autoridade. G.
e E. v�em de fam�lias com problemas financeiros graves, mas o que predomina, nos tr�s,
s�o que se originaram de lares desfeitos, o pai abandonou a casa, a m�e n�o tem
interesse as hist�rias coincidem sempre no mesmo ponto, s�o quase que rejeitados pela
fam�lia. S�o casos mais complexos.
E., por exemplo, n�o gosta de
ficar na sala de aula. Certa vez ele est� brigando com os colegas e a professora n�o
sabe o que fazer e nos chama para dar um aux�lio. No entanto, E. n�o obedece, nem a
professora nem a mim. Quando sua m�e comparece � entrevista, descubro que E. est�
entregue aos cuidados da av�, pois segundo ela n�o conseguiu achar col�gio perto de
onde mora e lhe conto ent�o que o garoto n�o s� est� indisciplinado na escola, como
tamb�m, segundo relato de outras m�es, ele permanece o tempo todo na rua quando est� em
casa. Na verdade , ele est� quase abandonado. a m�e disse que pretende arrumar vaga ano
que vem perto de onde trabalha, para poder ficar com o filho e acompanhar seu desempenho
escolar. O caso de G. � mais complexo, porque a m�e literalmente o abandonou aos
cuidados da irm� dela depois que o pai dele morreu e procurei, atrav�s da irm�, tentar
conversar com a m�e para que ela, aos poucos, reassuma seu papel de m�e e acompanhe o
desenvolvimento do filho. Descubro que a gravidez de G. foi indesejada e que ela hoje
procura, como diz " voltar � vida" que acredita ter perdido quando casou. Aos
poucos, vou buscando com ela que consiga conciliar essa volta � vida com o cuidar do
filho, que uma coisa n�o tem que necessariamente excluir outra. Procuro convenc�-la a
seguir um tratamento na cl�nica do CAE. Quanto a fam�lia de R., seus pais estavam eme
processo de separa��o e por isso negligenciavam a crian�a. N�o foi preciso muito para
convenc�-los a n�o destru�rem os filhos durante a separa��o. Ap�s terem ido para a
cl�nica do CAE, conseguiram realizar uma separa��o de forma saud�vel e madura,
beneficiando R.
O �ltimo caso ananlisado antes
de entrar de forma mais detalhada nas interven��es realizadas ap�s essas entrevistas
com a fam�lia, � o de E., 9 anos, que perdera a m�e recentemente. Seu pai comparece a
entrevista e parece bem interessado no comportamento do filho que n�o acompanha as aulas
e anda indisciplinado, correndo o risco de reptir o ano pela primeira vez.
Descubro que a m�e dele morreu
em agosto de 97 e neste ano de 98 E. apresentou seus problemas de aprendizagem, seu pai
esteve doente em junho do mesmo ano. Depois de entrevistar E. ele deseja fazer um desenho.
Lhe dou papel e uma caneta e ele faz um desenho, bastante sangrento, com facas. come�o a
lhe perguntar sobre o desenho e logo E. est� falando da m�e. Ainda paira muitas d�vidas
em sua cabe�a, principalmente porque a fam�lia n�o esclareceu a ele todos os detalhes
do crime. Noto que essas d�vidas s�o muito angustiantes para E. e ele n�o sabe bem o
que sente. Ap�s v�rias entrevistas, a fam�lia e E. consentem em encaminh�-lo para a
cl�nica no CAE. Na sala de aula, tra�o metas com a professora no intuito de fazer E.
colocar para fora seus sentimentos, mas dentro dos conte�dos propostos, para que ele
encontre uma maneira produtiva de express�-los.
CONCEP��O DE
SUJEITO DENTRO DA ESCOLA
Ap�s ter demonstrado minhas
v�rias interven��es dentro da escola com a fam�lia, penso ser necess�rio esclarecer
mais meu referencial te�rico acerca do que � o sujeito aluno na escola, para que adiante
possa falar das interven��es com o corpo docente e de como elas se integram entre si.
At� aqui demonstrei mais interven��es a n�vel cl�nico, que constitu�ram uma parte do
trabalho, mas n�o o todo. Penso que a interven��o cl�nica na escola � uma ferramenta,
mas n�o um fim em si. Ela serve, como nos v�rios casos citados acima, para pensarmos em
caminhos poss�veis na busca de solu��o.
Em primeiro lugar, � preciso que
percamos aquela no��o de que o aluno � o " xis" do problema. Embora nos casos
relatados eu tenha intervindo na fam�lia e encaminhado alguns alunos, nem de longe essa
� toda a resposta. Porque primeiro temos que ter bem claro o que � uma escola, e o que o
aluno vem buscar nela. Piaget nos diz sobre isso que:
" Afirmar o direito da
pessoa humana � educa��o � pois assumir uma responsabilidade muito mais pesada que a
de assegurar a cada um a possibilidade da leitura, da escrita e do c�lculo: significa, a
rigor, garantir para toda crian�a o pleno desenvolvimento de suas fun��es mentais e a
aquisi��o dos conhecimentos, bem como dos valores morais que correspondam ao exerc�cio
dessas fun��es, at� a adapta��o � vida social atual. � antes de mais nada, por
conseguinte, assumir a obriga��o- levando em conta a constitui��o e as aptid�es que
distinguem cada indiv�duo- de nada destruir ou malbaratar das possibilidades que ele
encerra e que cabe � sociedade ser a primeira a beneficiar, ao inv�s de deixar que se
desperdicem importantes fra��es e se sufoquem outras." (Jean Piaget, Para onde
vai a educa��o?, p�g. 34)
Assim, a escola n�o s� d� um
suporte de conhecimento para o aluno, como forma-lhe a personalidade. N�o basta o aluno
repetir os conte�dos de forma correta como monoc�rdio, nem mesmo de dizermos que a o
papel da escola, frente aos alunos com dificuldades termina quando os enviamos para a
cl�nica ou o entregamos a fam�lia. A escola tem um papel extremamente importante na
forma��o de um indiv�duo.
" ... a evolu��o
interna do indiv�duo apenas fornece um n�mero mais ou menos consider�vel, segundo as
aptid�es de cada um, de esbo�os suscet�veis de serem desenvolvidos, anulados ou
deixados em estado inacabado. Trata-se por�m apenas de esbo�os, e unicamente as
intera��es sociais e educativas haver�o de transform�-los em condutas eficazes ou
destru�-los para sempre." (Jean Piaget, Para onde vai a educa��o?, p�g. 35)
A escola � tamb�m orientadora
da fam�lia, no que concerne ao papel que cabe a esta na educa��o e nos caminhos a
estimular a aprendizagem. O ensino n�o termina quando a crian�a sai da escola: ele
continua, por toda a vida. somos eternos aprendentes. Al�m disso, n�o � apenas o
conte�do de sala de aula que a crian�a vem a aprender: com seu professor, a crian�a
aprende valores �ticos e morais, rela��es sociais, normas e regras, a melhor forma de
expressar seus sentimentos e a desenvolver suas potencialidades. Em suma, toda a
personalidade da crian�a � definida n�o somente pela escola pois j� vimos a
import�ncia da fam�lia, mas tamb�m por esta.
Penso que, para que a escola
possa formar cidad�os no mais pleno sentido desta palavra, seu papel tem que ser de um
centro aglutinador da comunidade na qual pertence. Assim, uma das minha principais
interven��es a n�vel da escola enquanto institui��o, � de poder estabelecer um
di�logo mais frut�fero entre a fam�lia e a escola, entre a comunidade e o que a escola
representa, como um centro de saber. A escola pode servir como palanque das vozes da
fam�lia, as d�vidas e anseios desta, pode servir tamb�m como aconselhadora na hora em
que a fam�lia precisa de outros servi�os, como m�dico, ou mesmo auxiliar quando sabe de
algu�m que procura emprego( um pai desempregado, por exemplo), ou seja, a escola n�o �
apenas um lugar onde a crian�a entra e sai, mas um ponto onde pode-se trabalhar o que os
pais esperam da educa��o dos filhos, como obter isso e principalmente, que se possa
debater, junto aos professores e a fam�lia, sobre as formas de ensino.
A minha id�ia de interven��o
� possibilitar que os v�rios aspectos que comp�e a escola- professores, alunos, pais,
administra��o e mesmo funcion�rios- formem uma rede onde o aluno ser� visto n�o
somente dentro da sala de aula, mas como um sujeito dentro de sua comunidade, suas
rela��es familiares, com os colegas, tudo isso s�o substratos que tem sua import�ncia
na aprendizagem do aluno. a escola � o p�lo concentrador de todos esses aspectos, para
redirecion�-los de forma positiva e construtiva, para que o aluno possa produzir
futuramente um trabalho enriquecedor para a comunidade. a escola n�o termina quando o
aluno vai para casa, mas sim est� l� tamb�m auxiliando a fam�lia a relacionar-se
positivamente com a crian�a. Isso � o que busco em minha interven��o a n�vel de
escola como um todo, faz�-la sair do modelo tradicional criticado por Piaget:
" Essas s�o as no��es
que inspiraram as doutrinas da escola tradicional:(...) Basta, em suma, acumular
conhecimentos na mem�ria, ao inv�s de conceber a escola como um centro de atividades
reais( experimentais) desenvolvidas em comum, tal como se elabora a intelig�ncia l�gica
em fun��o das a��es e trocas sociais." (Jean Piaget, Para onde vai a
educa��o?, p�g. 15)
Para tanto, cobra-se do aluno uma
postura cr�tica, n�o passiva, que ele aprenda que o conhecimento n�o � um edifico
acabado, mas antes um local de experimenta��o, em eterna constru��o e renova��o. O
conhecimento exige, para ser produzido, que tenhamos sujeitos pensantes, atuando nele,
dando sua configura��o pessoal ao que produz dentro da sala de aula. Como diz Fernando
Becker:
" O sujeito epist�mico
s� o � na medida em que ele se constitui como tal. E ele se constitui como tal pela
assimila��o e pela acomoda��o combinadas. Rejeita-se, portanto, da forma mais radical
que se pode imaginar, um sujeito passivo... a experi�ncia jamais � recep��o passiva:
� acomoda��o ativa, correlativa � assimila��o." (Fernando Becker,
Epistemologia do Professor, p�g.21)
Faz-se necess�rio n�o s�
avaliar os problemas reais dos alunos, mas tamb�m crer que a solu��o da problem�tica
emocional n�o se dar� encaminhando-os para a cl�nica, mas tamb�m encontrando, dentro
da sala de aula, formas para que eles possam deixar vir � tona essa problem�tica que
vivem: n�o sequer alunos perfeitos, mas que saibam utilizar construtivamente e
produtivamente seus problemas, sejam quais forem.
" Um corpo � dado por
hereditariedade; um sujeito � constru�do passo a passo, minuto a minuto, por for�a da
a��o pr�pria. A��o no espa�o e no tempo. A��o sobre o meio social, econ�mico,
cultural, nunca a��o no vazio." (Fernando Becker, Epistemologia do Professor,
p�g.19)
O sujeito se constr�i por suas
a��es, por suas rela��es, pelo seu m�todo de encarar o mundo. Um sujeito n�o �
apenas um aluno que assimila conte�dos, mas que os altera, que interv�m com sua
personalidade neles. Um sujeito � construtor e desconstrutor ao mesmo tempo, assimila e
acomoda.
" O sujeito � sujeito
na medida em que � sujeito hist�rico. � sujeito hist�rico na medida em que "
traduz" sua organiza��o biol�gica pelas a��es pr�prias da cultura na qual
vive." (Fernando Becker, Epistemologia do Professor, p�g.18)
� aprendendo a agir na cultura
onde vive que a escola pode dar ao aluno sua maior contribui��o, que � n�o s�
transmitir conte�dos, mas dignidade, status de cidad�o. O que, infelizmente, ainda n�o
� a realidade da escola.
" Nossa hip�tese- e que
v�rias pesquisas nossas a comprovam- � a de que o ensino escolar em vez de promover,
op�e-se � constru��o do sujeito epist�mico." (Fernando Becker,
Epistemologia do Professor, p�g.27)
Onde est�o as principais falhas
das nossas escolas? em primeiro lugar, depende das posturas extremistas que se adota, como
por exemplo do professor ocupando o lugar do mestre que transmite um conhecimento pronto,
acabado, definido, imposs�vel de ser mexido. Becker fala sobre isso:
" ... uma pedagogia
centrada no professor tende a valorizar rela��es hier�rquicas que, em nome da
transmiss�o de conhecimento, acabam por produzir ditadores, por um lado, e indiv�duos
subservientes, anulados em sua capacidade criativa, por outro. Consideram o sujeito da
aprendizagem, em cada novo n�vel, como t�bua rasa." (Fernando Becker,
Epistemologia do Professor, p�g.9)
Assim desconsidera-se toda a
bagagem cultural que o aluno traz e isso implica tamb�m em se deixar de lado a
problem�tica familiar no contexto do ensino e o pr�prio papel da fam�lia. Sem
considerar o saber j� constru�do do aluno, a fam�lia n�o tem lugar na escola, como se
estivesse � parte desta. Por outro lado, supervalorizar esse saber que o aluno traz �
desconsiderar que ele necessita de aux�lio para desenvolve-lo de forma produtiva, sadia e
trazendo benef�cios para a comunidade na qual pertence.
" ... uma pedagogia
centrada no aluno pretende enfrentar os desmandos autorit�rios do modelo anterior,
atribuindo ao aluno qualidades que ele n�o tem..." (Fernando Becker,
Epistemologia do Professor, p�g.10)
O terceiro caminho, proposto por
Piaget, pode nos referenciar melhor de como trabalhar as rela��es entre o professor e o
aluno:
" Uma pedagogia centrada
na rela��o tende a desabsolutizar os p�los da rela��o pedag�gica, dialetizando-os.
Nenhum dos p�los disp�e de hegemonia pr�via. O professor traz sua bagagem, o aluno
tamb�m." (Fernando Becker, Epistemologia do Professor, p�g.10)
Na minha interven��o entre os
professores, procurei direcionar a conduta deles, tendo como refer�ncia um melhor
m�todo, para lidar com os alunos indisciplinados, que se pudesse faz�-los expressar suas
problem�ticas internas, seja nas tarefas ou at� na forma de assimilar o conte�do, mas
tendo em conta normas e regras para isso, ditadas pelo professor. Por exemplo, um aluno
irrequieto poderia expressar toda sua energia em uma atividade de desenho, fazendo o que
quisesse livremente, mas concentrando-se na folha de papel e n�o saindo de seu lugar e
mexendo com os colegas. Assim, atrav�s deste exemplo simples, pude mostrar aos
professores como � esse referencial metodol�gico, que n�o impede ao aluno sua liberdade
de express�o, mas postula que ela tem de se dar dentro de certos par�metros. Com um
di�logo com os professores, pude notar que eles mesmos acrescentaram diversas formas de
traduzir esse referencial nas atividades escolares, muitas que eu nem mesmo tinha
concebido. Assim eu pude tamb�m aprender sobre a sala de aula, pois existem vari�veis
que eu n�o teria pensado, que somente quem vive o cotidiano do trabalho de doc�ncia pode
perceber. Foi bastante instrutivo para mim.
Para que possamos entender o
aluno como um elemento ativo no processo de conhecimento, temos que levar em conta que ele
est� situado em um determinado per�odo hist�rico. Este ponto � levantado como de
fundamental relev�ncia, para Piaget, como demonstra Becker:
" Piaget discorda, em
quatro pontos, da teoria da Gestalt: uma estrutura tem g�nese, isto �, ela �
constitu�da num leg�timo processo hist�rico... A experi�ncia, ou seja, a a��o e a
coordena��o das a��es ou a pr�tica, num contexto hist�rico determinado, tem toda a
import�ncia que se pode imaginar. " (Fernando Becker, Epistemologia do
Professor, p�g.17)
Por isso � muito importante
considerar a problem�tica do aluno, conhecer seu ambiente familiar. Foi baseado nessas
premissas que decidi conversar com a fam�lia, visto que, considerei eminentemente
oportuno levar-se em conta a historicidade do aluno, seu contexto onde vive e qual seu
papel nessa estrutura familiar. Atrav�s de um contato com a fam�lia, pude contextualizar
melhor o aluno como sujeito e, o pr�ximo passo, � permitir que os professores tamb�m
possam manter la�os estreitos com a fam�lia, ou seja, poder atrav�s de interven��es
limpar o canal de comunica��o entre a fam�lia e a escola, para melhor entendermos a
historicidade da crian�a. Como nos diz Ivete e Maria de F�tima:
" A vida do cotidiano
n�o � s� consci�ncia( l�gico-racional); � sobretudo, emo��o, porque � a puls�o
subjetiva do sujeito face �s intima��es do meio social; � resposta subversiva �
tentativa do enquadramento totalit�rio que o conhecimento-consci�ncia arma para subsumir
o sujeito heterog�neo." (Ivete Manetzder Keil e Maria de F�tima Mussi
Monteiro- Construtivismo X Positivismo, p�g. 63)
Isso mostra como as emo��es-
mesmo as que percebemos como patol�gicas, como os excessos de ansiedade, agressividade-
tamb�m est�o inclu�dos em um processo de aprendizagem, sendo uma parte importante
deste. As duas autoras nos d�o mais detalhes:
" O construtivismo(...)
interage em dois pontos: o Dionis�aco- dram�tico- e o Prometeico- l�gico. O dram�tico
� tempo vivido, � ordem dos acontecimentos que, encompassando as inst�ncias da l�gica,
da emo��o e da ideologia, se traduz na Harmonia Conflitual. J� o l�gico tra�a o
ideol�gico pela " for�a" do conhecimento. Contudo, enquanto no Positivismo o
conhecimento � a verdade absoluta, no construtivismo este absolutos relativiza, na medida
em que o conhecimento � utilizado como instrumento que, ao interrogar as verdades dos
sujeitos, questiona o pr�prio conhecimento a partir das hip�teses que se configuram no
tempo Dionis�aco." (Ivete Manetzder Keil e Maria de F�tima Mussi Monteiro-
Construtivismo X Positivismo, p�g. 64)
Assim vemos que � importante,
para entendermos o processo de aprendizagem do aluno, saber de sua hist�ria anterior a
hist�ria escolar, pois o conhecimento se realiza dentro do tempo hist�rico que o aluno
vive. N�o acharia poss�vel entender as dificuldades dos alunos se minha interven��o
n�o tivesse passado antes por uma entrevista com a fam�lia, onde pude coletar dados para
exemplificar ao professor como a problem�tica familiar ocupa papel central nos problemas
de aprendizagem e, fazendo-o ter esta constata��o, buscarmos juntos- eu e o professor-
solu��es que englobem essa historicidade. a partir da �tica do professor
construtivista:
" O jogo que o
conhecimento arma, na perspectiva construtivista, � o do paradoxo- revela a falta e
oferece ilus�es de completude- e isso determina a �tica do professor construtivista. Por
um lado contraria o Projeto Positivista que tra�a o caminho para uma vida no futuro,
eliminando assim o sujeito; por outro, afirma o vivido cotidiano, isto �, o Presente,
onde se inscreve que a sa�da do drama est� " no" e " com" o Sujeito.
Nesse sentido, a �tica construtivista d� suporte ao drama, todavia, n�o para ele
permanecer, mas antes, pelo conhecimento fazer o chamamento da trag�dia que o drama
oculta:" desafio sacrificial ao mundo para que existe por natureza, tudo existe
apenas ao desafio que se lhe lan�a e ao qual � obrigado a responder", diz
Baudrillard." (Ivete Manetzder Keil e Maria de F�tima Mussi Monteiro-
Construtivismo X Positivismo, p�g. 64)
Neste sentido, vemos como o
construtivismo pressup�e que o professor possa trabalhar e entender as quest�es que o
aluno traz de seu contexto e possa faz�-las progredir em um sentido positivo. Assim, n�o
basta encaminhar-mos o aluno para a cl�nica, se esta ficar� distante da escola, ou seja,
se o trabalho cl�nico, se o levantamento e a analise das problem�ticas familiares e
hist�ricas que o constituem sujeito n�o terem uma reverbera��o no trabalho de ensino
dentro da escola. A cl�nica participa com solu��es para a aprendizagem, trazendo e
fazendo frutificar a dramaticidade da exist�ncia do aluno.
" Assim, o la�o com o
saber necess�rio para que o conhecimento transmitido pelo professor produza efeito de
aprender no aluno chama a discuss�o do social, interrogando-se a partir desse social.
La�o social com o saber que, da viol�ncia gerada pelo mergulho nas diferen�as, amarra
no caos do cotidiano �ulico a sua l�gica de interven��o, resituando a transmiss�o do
conhecimento n�o mais na arbitrariedade da verdade absoluta mas numa escolha que desafia
esse absoluto totalit�rio e ataca violentamente a tranq�ilidade que aparentemente a
verdade objetiva oferece aos atores- professor e aluno." (Ivete Manetzder Keil e
Maria de F�tima Mussi Monteiro- Construtivismo X Positivismo, p�g. 64)
Abordei at� aqui a import�ncia
da interven��o que eu realizei com a fam�lia, para entender o aluno como um todo,
enquanto em seu lugar de sujeito. Levantei aqui a import�ncia deste trabalho para a
aprendizagem em sala de aula. Agora quero trazer outro ponto � tona, a respeito da
import�ncia do ensino como um m�todo construtivo, a import�ncia da experimenta��o
para a constru��o do conhecimento para este ser aprendido como um processo inacabado,
pass�vel de ser reconstru�do e renovado a cada instante.
Antes, um adento: At� aqui
demonstrei minha interven��o, quase exclusivamente cl�nica, nos alunos e fam�lia e
agora tamb�m falarei de interven��es quase isoladas em rela��o a escola em si. N�o
ocorreu assim no entanto, mas para fins did�ticos, separei estas duas partes inicias com
as minhas interven��es e deixei para o final a minha interven��o com o corpo docente e
o SOE, onde essa coleta de dados que realizei entre a fam�lia e as possibilidades de
aprendizagem pela experimenta��o, atrav�s de uma t�cnica nova chamada LOGO, me permite
demonstrar aos professores novas possibilidades de abordar antigos problemas e de que
pode-se, sim, criar solu��es novas, que nem tudo est� perdido. considero que a
aplica��o da t�cnica logo, longe de esgot�-la, tem por car�ter preparar o terreno
para que os professores possam serem contribu�dos com ela.
Esse adendo serviu como um aviso
para que se tenha em mente que o gancho final, onde todas essas interven��es se
constituir�o em um trabalho mais profundo dentro da institui��o escola, ser� exposto
aqui na �ltima parte, onde falo das interven��es nos professores e outros
profissionais.
Embora na realidade tudo tenha
ocorrido sincronicamente, separei a interven��o na escola pois a considero a parte mais
importante de meu trabalho. � objetivo meu, fazer com que as interven��es se aglutinem
no trabalho dos professores e possam trazer interroga��es e mudan�as para os m�todos
de ensino adotados pela escola. Meu objetivo � n�o s� construir um bom trabalho, mas
que ele traga seus frutos na escola como um todo. Portanto, deixo a interven��o dos
professores em �ltimo lugar para melhor discutir isso e apontar pr�ximos projetos e
dire��es poss�veis, tendo em mente que, apesar de se estar falando de projetos futuros,
tamb�m falo de v�rias interven��es j� realizadas, que constituem a situa��o
presente do trabalho.